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Eugénia Grandet

Honoré de Balzac

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A boa literatura tem, entre outras, a função de transmitir experiência humana real, seja por analogias simbólicas ou fantásticas, seja por retratos realistas. Balzac foi o precursor do realismo literário ao introduzir na escrita uma dimensão da vida humana que até então não tinha expressão plena.

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Assim ele inicia esta obra:

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“Encontram-se no fundo das províncias algumas figuras dignas dum sério estudo, caracteres cheios de originalidade, existências tranquilas à superfície e secretamente devoradas por tumultuosas paixões; mas as asperezas mais vivas dos caracteres, mas as mais apaixonadas exaltações, terminam por desaparecer na permanente monotonia dos costumes. Nenhum poeta tentou descrever os fenómenos desta vida que se extingue, suavizando-se sempre. Porque não? Se há poesia na atmosfera de Paris, onde sopra um simoun que arrebata as fortunas e despedaça os corações, não a haverá também na lenta acção dum siroco da atmosfera provinciana que afrouxa as mais altivas coragens, distende as fibras e desarma as paixões da sua intensidade? (…) Na província não se notará nem relevo nem saliência; mas haverá dramas no silêncio; mistérios habilmente disfarçados; catástrofes numa só palavra; (...)”


 

Esta é, em suma, a descrição essencial da história de Eugénia e seus antagonistas, passada na província francesa de Saumur.


 

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As Personagens

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O Sr. Félix Grandet é um mestre tanoeiro e vinhateiro, mas principalmente é o retrato da avareza. Todas as suas acções gravitam em torno da acumulação e economização de dinheiro, e este é, para si, a medida da felicidade. “É preciso ter dinheiro para ser feliz”, diz ele. As relações sociais não são mais que um meio para obter dinheiro, e mesmo as suas relações familiares são obscurecidas e relegadas para um plano inferior. Se há amor nesta alma, todo ele é devoto ao dinheiro.

Torna-se mais clara esta obsessão pelo constante esforço de Grandet em esconder o valor de sua fortuna, até da própria família. Ele admira o seu ouro na privacidade do seu escritório blindado a ferro, porém insiste em declarar a qualquer um que encontre: “Não tenho um soldo!” Não só se recusa a ostentar, como também não permite que se gaste um cêntimo mais que o necessário.


 

A Sra. Grandet, que dedica a sua vida à filha e à religião, é o símbolo da mulher submissa, recatada, quase em oposição à “grande Nanon”, a criada, que “era talvez a única criatura humana capaz de suportar o despotismo do seu amo”. Nanon, “um ente feminino talhado em Hércules”, tem mais protagonismo nesta novela que a Sra. Grandet, cujo nome não chegamos sequer a conhecer.


 

Eugénia Grandet, filha do Sr. e da Sra. Grandet, é a moça provinciana, educada entre a herdade e a igreja. Enquanto jovem, personifica a ingenuidade e pureza características de escassas raparigas do século XXI. Já no fim da narrativa, decorridos alguns anos, a grande mudança de Eugénia é a perda da ingenuidade, mas não da pureza.


 

Carlos, de Paris, sobrinho do Sr. Grandet, é filho de uma educação que no nosso século se tornou regra. Protegido pelos pais do lado sombrio da vida e habituado a ter os seus caprichos satisfeitos, persegue, ao contrário de seu tio, uma vida de ostentação e gloríola social. É delicado e efeminado.


 

Como personagens de fundo, que auxiliam o retrato social balzaquiano, temos os Cruchot e os Des Grassins, as duas únicas famílias que tinham acesso à casa Grandet e tratavam dos negócios do senhor. Entre elas havia a disputa pela mão de Eugénia, com vista a se apoderarem da herança da rapariga.


 

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A narrativa

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Enquanto os Cruchot e os Des Grassins se gladiam dissimuladamente por um casamento de conveniência, o primo Carlos aparece, pela primeira vez, na casa Grandet. Traz uma carta de seu pai – cujo conteúdo ele desconhece – dirigida ao tio. É uma carta de suicídio que revela a sua falência e dívida financeira, evento que o leva a tomar a decisão de terminar a sua vida e “legar” o seu filho Carlos a seu irmão.

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“Ah! Se meu filho não encontrasse em ti auxílio nem afeição, eu pediria eternamente a Deus vingança contra a tua dureza.”

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Félix Grandet não fica comovido pela morte do irmão, mas é afectado pelo peso do seu sobrinho na sua casa – afinal, é uma despesa que ele não está disposto a suportar. Logo trata de tomar providências para resolver a dívida do irmão e enviar Carlos para as Índias.


 

Eugénia interessa-se por Carlos no primeiro momento em que o vê. Este é um ponto de viragem na sua vida de hábitos quase monásticos. Doravante, tudo o que ela conhece do seu entorno recebe uma nova luz, uma renovada beleza, situação comum dos apaixonados.


 

“Na vida pura e monótona das mulheres jovens aparece uma hora deliciosa em que o sol se expande da alma, em que a flor exprime sentimentos, em que as palpitações de coração comunicam ao cérebro o seu calor fecundante e como que fundem as ideias num desejo vago. Dia de melancolia inocente e de alegrias suaves! As crianças sorriem quando começam a ver; quando uma rapariga entrevê o sentimento na natureza, sorri de modo igual à criança. Se a luz é o primeiro amor da vida, não será o amor a primeira luz do coração?

Este momento chegara para Eugénia.”


 

Ao contrário de Grandet, as mulheres da casa acolhem o parisiense sob a gerência de Eugénia, levada pela paixão a mover tudo ao seu alcance para agradar o primo de sofisticadas origens. É aqui que vemos pela primeira vez na rapariga uma audácia que, sendo estranha aos hábitos da família, só podia ter origem na sua própria alma.


 

Eugénia nunca conheceu as tormentas vulgares das relações passionais. O amor que desponta num coração puro apenas se importa com o bem do ser amado, e Eugénia naturalmente se aproximou do ideal de amor cristão – servir o próximo e desejar sempre o seu bem. Foi esta qualidade que a levou a doar todo o seu ouro a Carlos de forma a ajudá-lo a pagar a viagem para as Índias, onde ele planeava recuperar sua fortuna. Assim era a generosidade de Eugénia.


 

Tocado pela atitude da sua prima, pelo acolhimento das restantes mulheres da casa, e porque o seu coração estava de luto, Carlos apaixona-se também por Eugénia. Depois de pouco tempo entre passeios românticos, trocas de promessas e um ou dois beijos roubados, o rapaz parte, finalmente, para as Índias.


 

O Sr. Grandet tinha o ritual de, a cada novo ano, pedir à filha que lhe mostrasse o seu ouro para que pudesse contá-lo e admirá-lo, e foi nesse momento que a família caiu em desgraça. Ao perceber o que tinha acontecido, Grandet praticamente cortou relações com a filha, levando a Sra. Grandet ao desgosto. Condenou Eugénia ao confinamento do seu quarto, proibindo-a de confraternizar com a própria mãe, e alimentando-a apenas de pão e água, tudo isto por tempo indeterminado. O que Eugénia havia feito, para Grandet, era imperdoável. “Ofendeste-me no que eu tenho de mais caro. Não quero tornar a ver-te senão submissa.”


 

Para a Sra. Grandet o desgosto foi mortífero. Adoeceu no momento em que pai e filha quebraram os laços, acamou, e definhou ainda esse ano. Tinha apenas energia para suplicar ao marido que se reconciliasse com a filha, pedido vão e frustrado. A mulher submissa, quase invisível na narrativa e na sua vida, não pôde fazer mais do que adoecer. Era próprio do seu tipo de personalidade. Ela não seria capaz de confrontar o marido, ou de exigir dele uma atitude diferente. Não se zangava, talvez por preceito, por princípio, ou talvez por hábito. O que parece certo é que a sua lenta caminhada para a morte foi a última tentativa de se fazer ouvir. E no fim estava feliz em partir.


 

Não obstante, a Sra. Grandet pôde ver a reconciliação da sua família pouco tempo antes da sua morte. O pai Grandet foi levado a tal por motivo de força maior – o dinheiro. É que a situação era a seguinte: Eugénia era a herdeira do dote da mãe, que consistia em várias propriedades administradas então pelo pai. Grandet não se permitiria perder nem a ínfima parte da sua fortuna, logo, viu-se na necessidade de estar bem com a filha. Eugénia nunca soube de tais conjunturas, e muito menos suspeitou, visto que para ela o dinheiro era somente um meio, e coisa que ela não entendia de todo, nem mesmo tinha curiosidade.


 

Foi no dia seguinte à morte da sua mãe que Eugénia, a pedido do pai, renunciou à sua herança. Para a jovem, isto nada significava. Havia acabado de perder a mãe, e num instante a sua vida ficou mais triste. A dor do luto aliara-se à melancolia do amor insatisfeito, e andava Eugénia assim, resignada aos fazêres dos dias comuns, repetindo processos e movimentos sem significado. Nos cinco anos seguintes, Grandet ensinou à filha tudo acerca da administração da casa, dos negócios e da fortuna. Eugénia absorvia os ensinamentos sem resistência, limitando-se a repetir e a perpetuar o sistema avarento.


 

Por fim, morre o Sr. Grandet, de velhice, tendo sido igual a si mesmo até ao fim da vida, evoluindo apenas no grau de avareza. Fica Eugénia com uma fortuna milionária e um legado invejável. Mas para ela “a fortuna não constituía nem um poder, nem uma consolação; só podia existir pelo amor, pela religião e pela fé no futuro.” Continuava à espera de Carlos, e ia ao longo dos anos fundindo-se com a sua própria melancolia, questionando por que ele nunca lhe escreveu.


 

E o que era feito de Carlos? Pois que se esqueceu da rapariga pouco depois da sua viagem. A memória de Eugénia esfumou-se entre as inúmeras formas femininas que ele conheceu. Carlos, o delicado menino de Paris, corrompeu-se por inteiro, tornando-se um traficante de escravos e instigando vãs ambições de reconhecimento social. A sua causa final era pertencer à nata e ser rico. Por este motivo, assim que retornou a França casou-se com a marquesa d'Aubrion, uma rapariga “muito feia que a mãe pensava casar sem dote”, porém dar-lhe-ia a fortuna e o acesso à alta sociedade. Mal ele sabia da fortuna de Eugénia.


 

Eis que chega a Eugénia a carta de Carlos, sete anos depois da sua partida. Nela ele revela o seu plano, causando na rapariga o derradeiro desgosto. É então que Eugénia, que nesse momento era como a rainha de Saumur, decide casar-se com o sobrinho Cruchot, cedendo à pressão social que era diária e vinha de todos os lados. Esta decisão de Eugénia é como uma rendição, contudo ela coloca condições que protegem a sua pureza – a condição é que o casamento seja apenas de fachada, e deste modo preserva-se de entregar o corpo a um homem que nunca terá o seu coração.

 

“Senhor Presidente, eu sei o que lhe agrada em mim. Jure-me que me deixará livre durante toda a minha vida e que não me recordará nenhum dos direitos que o casamento lhe pode dar sobre mim, e é sua a minha mão. (…) Eu não devo enganá-lo. Tenho no coração um sentimento inextinguível. A amizade é o único sentimento que posso conceder a meu marido; não quero ofendê-lo, nem transgredir as leis do meu coração. Mas não possuirá a minha mão senão em troca de um imenso serviço.”


 

Poucos anos depois, morre o marido de Eugénia. Fica então só, sem filhos, perpetuando a existência no hábito do pai. Félix Grandet quis tomar para si toda a riqueza, viveu toda a vida em função desse acúmulo, legou a Eugénia e ainda exigiu que lhe prestasse contas na outra vida. A sua maneira de viver e o seu despotismo tiveram tal influência sobre a vida familiar, que poderíamos dizer que foi ele mesmo que causou o fim da família Grandet.


 

Há um tanto de trágico e um tanto de cómico nesta história. O desfecho é de sonhos românticos frustrados e de nobres sentimentos ignorados, mas podemos olhá-lo sob outro ponto de vista colocando a seguinte questão: o que aconteceria se Carlos tivesse sabido da fortuna da prima antes de prometer casamento à marquesa d'Aubrion? Seria provável que lhe voltassem à memória as antigas promessas de amor eterno, que no seu tempo foram verdadeiras, e que as usasse imoralmente para tomar posse da fortuna Grandet. O que seria de Eugénia então? Ela permaneceu intocada e inexperiente no que toca aos meandros agridoces das relações passionais, e face ao novo Carlos que se forjou no meio da escravatura e da promiscuidade, ela estaria numa posição de extrema vulnerabilidade. Poderíamos dizer que Eugénia, ainda que tenha terminado melancólica e desgostosa, foi poupada de um destino ainda mais trágico?


 

Pois de facto o que fica pairando sobre nós, leitores, ao concluir este livro é a figura quase santa de uma rapariga que nada mais tinha de extraordinário, se não essa pureza de sentimento, a doação fácil de si mesma em serviço ao próximo, e uma honestidade dignificante.

 

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As questões essenciais
 

A história incita o questionamento sobre as relações passionais. Quão fácil é ficarmos fixados na chama que se acende, na faísca que nos prende a atenção num dado pormenor, e cuja luz ofusca todo o entorno, impedindo a visão sobre outros recantos que são do nosso maior interesse? E quão fácil é sermos corrompidos pelo meio onde onde vivemos, que muitas vezes não é um mediador confiável e nem mesmo um professor competente? Eugénia, neste aspecto, simboliza a fidelidade à própria alma naquilo que é de mais valor – o serviço ao próximo, num mundo que tão afincadamente nos quer desviar desse propósito.


 

Grandet e Carlos viveram pelo serviço a si mesmos, ou melhor, pelo serviço à parte de si que está abaixo da moralidade. Há no homem esse potencial, mas não é essa a sua essência. Eric Voegelin, filósofo austríaco, considera que a essência humana é teomórfica, ou seja, ele é feito à imagem de Deus, e é a sua participação no Plano Divino, na Realidade criada por Deus, que o constitui ontologicamente. Ao “desdivinizar” o homem também se “desumaniza” o homem, visto que ser parte de Deus é parte essencial de ser homem. Quando a pessoa se esquece dessa essência, passa a viver como se fosse ela própria a sua criadora, e, como diz o filósofo brasileiro Olavo de Carvalho, ela deixa de ser conhecedora do bem e do mal como criatura, e passa a ser conhecedora do bem e do mal como criadora, isto é, ela determina o bem e o mal, repudiando a primazia da Realidade. As consequências nefastas desta via geralmente servem para despertar a pessoa desviada. Aquilo que frequentemente entendemos como “castigo” divino não é mais que uma admoestação que pretende orientar-nos para o melhor caminho.


 

Somos, especialmente no século XXI, obcecados com o prazer e a felicidade materiais, e pouco sensíveis às necessidades do espírito. O serviço ao próximo tornou-se, no indivíduo, um meio de propaganda pessoal, e no colectivo, um meio de controlo social. Esta obsessão com a felicidade terrena ergueu as mais mortíferas ideologias da era moderna, e todos os dias nos faz reféns de caprichos insignificantes. Não se deve rejeitar a felicidade quando ela vem, mas é impossível pagá-la com a aniquilação do sofrimento. Neste mundo, eles caminham juntos, e a perfeição reside no Deus puro. Acerca disto, eis as últimas palavras da senhora Grandet, que embora omissa, é a causa da nobreza de sua filha Eugénia: “Minha filha, saberás um dia que só no céu existe a felicidade”.

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Escritora

FRANCISCA SILVA

Da sede de conhecer

Ao abraço do Ser

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