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28 Outubro 2021

Francisca Silva

Socialismo e Neoliberalismo para totós

Se quando chegar no fim deste texto não perceber que, ao falar de socialismo e neoliberalismo estamos a falar de uma e a mesma coisa, ou você é um fanático socialista, ou não leu até ao fim. Mas atenção! Há uma diferença, sim. A diferença está em quem pronuncia as palavras.

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Comecemos devagar, pelas definições menos complexas:

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O Socialismo caracteriza-se pela posse dos meios de produção e da propriedade nas mãos do Estado.

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O Neoliberalismo caracteriza-se pela posse dos meios de produção e da propriedade nas mãos do “Grande Capital”.

 

Grande Capital é um termo universal abstrato que se usa para nomear os grandes grupos económicos independentes do poder político. Estes podem ser famílias ou indivíduos de fortuna dinástica ou corporações multimilionárias. Sendo imensamente ricas, elas têm a possibilidade de adquirir propriedade sem qualquer dificuldade, estabelecendo monopólios e controlando o valor do dinheiro. O monopólio é um dos demónios principais na luta dos grupos anticapitalistas. Na sua concepção, são eles que produzem desigualdade económica e de poder, ficando o controlo nas mãos do Grande Capital, e deixando uma extensa parcela da sociedade dependente de vender a sua força de trabalho (proletarizada), já que não tem outro meio de subsistência.

 

Estado é a estrutura governamental a partir da qual se gere a vida pública. Um Estado pode ser maior ou menor, e este é um elemento da luta ideológica entre a “esquerda” e a “direita”. Quanto maior o Estado, mais à esquerda; quanto menor, mais à direita. Um Estado grande detém o controlo sobre os vários sectores sociais: economia, educação, saúde, trabalho, militar, segurança social (previdência), etc. Um Estado totalitário detém o controlo de todos os sectores da sociedade, abolindo virtualmente toda a iniciativa privada. Tudo pertence ao Estado.

 

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Estabelecidos os conceitos, para que ninguém alegue nuances de interpretação absurdas, vamos ao raciocínio:

 

O argumento típico dos grupos anticapitalistas é que o “neoliberalismo” “captura” o Estado, e assim os Governos são controlados, não pela vontade do povo, mas pelos “privados”. Mas larguemos as metonímias. A realidade é: os indivíduos de grandes fortunas subornam os políticos em funções governamentais, e isso interfere nas suas políticas, fazendo-as ainda mais favoráveis à proteção dos seus monopólios, o que lhes permite deter mais controlo sobre a sociedade. Face a esta realidade, não podemos reduzir a responsabilidade aos subornadores, mas temos de exigi-la ainda mais dos governantes corruptos que se deixam subornar.

 

E o que acontece no socialismo? A propriedade e os meios de produção, em vez de estarem na mão dos privados, está nas mãos do Estado. O monopólio é estatal. E se está nas mãos do Estado, está literal e verdadeiramente nas mãos dos governantes que se encontram em funções. São esses que acabam por controlar as políticas, fazendo-as mais favoráveis à sua própria “família” - a família de sangue, e a família social e partidária. Há um factor importantíssimo que não devemos esquecer: sendo que existem excepções, a regra geral no que toca à psicologia preponderante nos meios partidários como eles existem hoje, é uma psicologia secularista e tribalista. A moral partidária tende a seguir a moral classista como fomentada por Engels e Lenin – o que é moral é o que favorece a causa revolucionária; a causa revolucionária é, no fundo, um meio de obter poder para aqueles que se aguentam mais tempo na busca desse poder.

 

Podemos concluir, então, que a diferença entre uma economia “socialista” controlada por uma minoria governamental, e uma economia “neoliberal” controlada por uma minoria privada não é muita. Ambos se afunilam em monopólios controlados por elites, e torna-se difícil dizer se são os privados que tomam conta do Estado, ou se é o Estado que toma conta dos privados.

 

Num pequeno à parte, reflitamos sobre como a palavra “privado” tem hoje uma conotação pejorativa, e como os falantes que a demonizam (normalmente à esquerda) não se importam em colocar no mesmo grupo os privados metacapitalistas (o grande capital) e os privados das classes média e baixa (indivíduos como eu e você), que não participam do jogo de poder neoliberal-socialista.

 

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Qual é o objetivo final deste pseudo-debate, que nos faz acreditar que existem dois pólos contrários onde existe apenas uma faca de dois gumes? Numa palavra, o controlo nas mãos de uma elite que escraviza o povo. Aqui entra o ideal marxista – o comunismo integral – que “prevê” o desaparecimento do dinheiro. Pois numa sociedade em que todos trabalham “de acordo com a sua capacidade” e todos recebem “de acordo com a sua necessidade”, desaparece o elemento da recompensa meritória que alimenta o nosso capitalismo. No sistema económico capitalista, cada um tem a possibilidade de melhorar seus rendimentos consoante o seu trabalho e o seu mérito, mas no ideal comunista cada um recebe o essencial para a subsistência e não mais do que qualquer outro – a igualdade plena. O marxista deduz que, numa sociedade sem dinheiro e onde teoricamente todas as necessidades estão satisfeitas, não haverá a tentação de ter mais do que o próximo.

 

O erro fundamental deste idealismo é a falha em perceber que a origem da cobiça não está no dinheiro ou no sistema, mas sim na condição humana. Se retirássemos os elementos materiais onde a cobiça se manifesta hoje, ela manifestar-se-ia em outros âmbitos, nomeadamente, no âmbito psicológico e emocional. O dinheiro desapareceria, mas a estrutura hierárquica não. A cobiça pelos bens materiais poderia desaparecer, mas com certeza iria agravar a cobiça pelo poder. Aliás, é muito fácil observar esse fenómeno entre aqueles cujas fortunas são tão imensas que já não lhes é necessário disputarem por mais dinheiro, mas apenas por mais poder.

 

Os marxistas acertaram quando revelaram (embora não fosse uma ideia original sua) que em todas as relações está o elemento do poder. O seu erro foi achar que elas se resumem à disputa de poder. Poder é a capacidade de influenciar outro indivíduo a efetuar uma determinada acção. Todos temos essa capacidade, e ela nem sempre é negativa ou nociva. Por vezes pode até ser profundamente benéfica. Os pais que têm sucesso em disciplinar e educar os filhos para torná-los pessoas verdadeiramente morais e virtuosas, fizeram-no exercendo o seu poder e autoridade como pais. Podemos dizer o mesmo de professores, mestres, ou mesmo amigos que em algum momento das nossas vidas conseguem exercer sobre nós o seu poder, provocando mudanças benéficas na nossa vida. O problema não é o poder em si, mas sim a finalidade para que ele é usado. Mas é verdade que o aumento de poder nas mãos de um indivíduo coloca-o numa situação cada vez mais vulnerável de tentação. É mais difícil abrir mão do poder quando se tem muito dele nas mãos; assim como é mais fácil não arruinar a vida dos outros quando não se tem qualquer poder para tal. Fica claro que, para produzir bons frutos, o poder deve ser usado sob a soberania da moralidade. Nem o dinheiro nem o sistema são elementos morais, logo, não são a causa eficiente dos problemas morais. Retomando o nosso cenário hipotético, desaparecendo o dinheiro e o sistema, os homens continuariam a ser homens, e a cobiça continuaria a encontrar canais de passagem.

 

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Disse no início que os termos neoliberalismo e socialismo se referem ao mesmo fenómeno, e que a diferença está em quem pronuncia as palavras. Quem se considera de esquerda tende a chamar esse fenómeno de neoliberalismo, e quem se posiciona à direita tende a chamá-lo de socialismo/comunismo.

 

Cabe-nos agora provar que “neoliberalismo” é apenas um termo de fumaça, que serve à esquerda para esconder a consciência do seu próprio fracasso, e poder continuar o movimento de luta, de contrariedade, de destruição, movimento esse que serve para arrecadar cada vez mais poder sobre a sociedade.

 

Vamos lá.

 

Liberalismo, na sua origem, está ligado ao livre comércio, isto é, o direito de qualquer pessoa comprar e vender os seus bens ou produtos, sujeito às leis implícitas do mercado, às negociações, fazendo a sobrevivência dependente do seu próprio trabalho e das suas escolhas. Não é uma ideologia nem pretende oferecer uma cosmovisão ou uma solução para a totalidade dos problemas da humanidade – refere-se simplesmente à economia.

 

Socialismo é todo um conjunto de ideologias, teorias, subversões e práticas que desemboca numa cultura. Esta cultura pressupõe uma determinada visão do mundo, um objetivo a atingir para a humanidade, e uma maneira de viver a ser imposta a todos os seres humanos. Qualquer teórico socialista/comunista admitirá que o socialismo é imperialista, pois pretende ser uma solução global, e seus apologistas não pararão “a luta” enquanto o mundo inteiro não estiver subjugado a esse sistema artificial.

 

Liberalismo, no sentido económico, defende que cada um seja livre para escolher o curso da sua vida em todos os campos – como e onde educar os filhos, onde tratar da saúde, como gerir o seu dinheiro e as suas posses, e decidir as suas convicções religiosas.

 

No Socialismo a liberdade é outra coisa. É o que Marx e Engels definiram como “livre-arbítrio”: o homem não pode escolher o seu caminho, pois esse caminho lhe é imposto pelo “Determinismo Económico”. Isto significa que o rumo que a sociedade toma é definido pelos meios de produção principais em determinado tempo. O livre-arbítrio do homem resume-se apenas à consciência que ele pode ter desse determinismo, e a sua escolha reduz-se ao grau de energia que ele emprega em seguir esse caminho, isto é, se aceita indolentemente, ou se se entrega vigorosamente. Este seria o argumento que os levaria a advogar a Revolução violenta e drástica para apressar a alegada queda do capitalismo e o advento “inevitável” do comunismo.

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Em suma, liberalismo é contrário à escravização do povo pela elite financeira e/ou socialista.

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Concluindo:

 

O Grande Capital é o poder financeiro, é a posse de muito dinheiro. E numa sociedade sem dinheiro continuaria a haver poder, com a diferença de que este não seria ancorado na posse de dinheiro, mas sim na posse das estruturas que mantêm o funcionamento da sociedade (meios de produção, etc.). Isto é, quer tenhamos à cabeça o Grande Capital (Neoliberalismo) ou o Grande Estado (Socialismo), a realidade de que uma minoria tem o controlo totalitário sobre a maioria é inevitável. Na nossa sociedade actual, o Socialismo traduz-se nisto: o Grande Capital aliado com o poder político.

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Como prova cabal e verificável temos o facto de que, desde há várias décadas, os metacapitalistas apoiam e financiam maioritariamente políticas públicas globais de esquerda; praticamente todos os governos de esquerda são "neoliberais". E como se não bastasse, devemos a esses metacapitalistas e aos governos de esquerda a sobrevivência de todas as experiências comunistas e socialistas do século XX, que teriam abortado espontaneamente não fosse a ajuda financeira.

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Qual é o ilusionismo que a esquerda pretende praticar? Esconder que ela sabe muito bem que o capital é necessário à humanidade, como a primeira experiência comunista do século XX provou (com Lenin). Não podendo destruí-lo, como manda a doutrina marxista, ela finge que ele a domina, quando é ela que deseja apropriar-se dele e dominá-lo completamente.

 

O termo “neoliberalismo” surgiu quando chegou um momento na vida do marxismo em que ele confessou a si próprio: eu preciso do capitalismo, mas não posso abdicar do discurso anticapitalista, já que é esse discurso que mantém a população inerme, já que com ele consigo levar seres humanos comuns a se auto-censurarem, a criarem bloqueios para si próprios nas suas vidas financeiras. Não. Tenho de continuar a afirmar que é moralmente errado ganhar muito dinheiro, enquanto amontoo a minha própria fortuna, e enquanto sou eu que dito qual é a quantia aceitável de dinheiro que o ser humano comum pode ganhar sem ultrapassar a linha do pecado imperdoável. Surgiu então o bode expiatório para esta miserável conduta.

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Escritora

FRANCISCA SILVA

Da sede de conhecer

Ao abraço do Ser

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